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Complexidades no caminho da simplificação da tributação

Complexidades no caminho da simplificação da tributação

O texto da reforma tributária aprovado pela Câmara dos Deputados é o início de uma relativamente longa jornada que – espera-se – coloque o País, pelo menos, no rumo da simplificação na apuração e recolhimento dos tributos sobre o consumo. 

O próximo passo é o início da análise do texto pelo Senado, podendo ser ou não aprovado. Na primeira hipótese, poderá ser aprovado com ou sem  alterações. Se aprovado com alterações substanciais, deverá retornar à Câmara para nova apreciação.

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De qualquer modo, se e quando aprovadas as alterações de natureza constitucional – que é o que trata o texto aprovado na Câmara – e se e quando editadas as normas complementares, ordinárias e a regulamentação pertinente (decretos, instruções normativas, etc.), o que se terá criado, num primeiro momento, serão pelo menos mais três “novos” tributos: CBS, IBS  e IS.

O primeiro (CBS) será uma contribuição social sobre bens e serviços de competência da União Federal, que substituirá, paulatinamente, as contribuições PIS e Cofins e o imposto sobre produtos industrializados (IPI).

O segundo (IBS), um imposto cobrado sobre a mesma base de cálculo da contribuição federal mencionada acima, cuja arrecadação se destinará aos Estados, Municípios e Distrito Federal, em substituição ao ICMS (estadual) e ISS (municipal).

Já o terceiro é um imposto federal, seletivo, a incidir ainda sobre a importação, produção e comercialização de bens e serviços nocivos à saúde e ao meio ambiente, o que, diga-se de passagem, não deixa de ser uma espécie de cheque em branco a permitir a incidência sobre praticamente toda e qualquer atividade humana. A escolha dos bens e serviços a serem taxados pelo novo imposto “seletivo” virá em momento legislativo posterior, infraconstitucional.

Alguns desses novos tributos serão inicialmente cobrados concomitantemente aos tributos atualmente existentes, em alíquotas simbólicas, durante um período de transição. Assim, neste período de transição, não se experimentará simplificação, mas relativo aumento da complexidade da apuração e recolhimento dos tributos.

A fase de transição, em tese, iniciar-se-á em 2026, com o início da cobrança “simbólica”  do IBS e da CBS (1% no total) e só findar-se-á em 2033, com a efetiva extinção do IPI, ICMS e ISS. O PIS e Cofins, já terão sido extintos a partir de 2027.

A reforma também prevê a transferência da competência para arrecadação dos impostos sobre o consumo dos Estados e Municípios de origem destes para os Estados e Municípios de destino dos bens ou serviços, segundo critérios a ainda serem definidos em legislação infraconstitucional.

Ainda que não se tenha definição exata acerca das alíquotas dos novos tributos,  – especula-se que não deve haver diminuição da carga tributária global, mas tão somente simplificação da apuração e recolhimento, muito em razão da unificação da maior parte da legislação e regulamentação dos tributos sobre o consumo de competência dos Estados e Municípios (atualmente ICMS e ISS), por meio  – entre outros –

da centralização através de um órgão deliberativo, o “Conselho Federativo do Imposto sobre Bens e Serviços“, que será gerido através de composição de representantes dos Estados, do Distrito Federal e de 27 representantes dos município, sendo metade deles representantes dos Municípios com maior população.

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Há expectativa de que alguns setores sejam beneficiados com redução da carga tributária, caso da indústria, e outros sofrerão aumento, notadamente o setor de serviços. E é natural que haja nesta fase uma intensa movimentação dos setores organizados da economia, no sentido de tentar garantir  que não haja quanto a eles, no processo legislativo em curso, aumento significativo de tributação quando se der a efetiva entrada em vigor do novo sistema.

Alguns setores da economia, conforme o texto então aprovado, já tem previstos regimes de  tributação diferenciada, possivelmente não se aplicarão a eles os tributos CBS, IBS e IS, ou serão  aplicados com regras diversas. Dentre estes setores, o texto faz menção a combustíveis, lubrificantes, serviços financeiros, bens imóveis, planos de assistência à saúde, concursos de prognósticos, compras governamentais, hotelaria, cooperativas, parques de diversão e parques temáticos, restaurantes e aviação regional.

Compliance Fiscal e ESG
Estar em conformidade com as regras tributárias vai além de cumprir prazos e obrigações. As empresas sustentáveis são aquelas que pensam de forma estratégica em compliance e governança através da tríade de ESG.

Vale salientar que, ainda que a reforma tributária tenha trazido alterações menores quanto a impostos sobre a propriedade (e.g., IPTU e ITCMD), o foco do texto que segue para discussão no Senado é sobre a tributação sobre o consumo.  Eventuais modificações sobre a tributação sobre a renda (e.g., tributação sobre dividendos) estão sendo tratados em apartado.

Outros regimes de tributação diferenciados, como o Simples Nacional e a posição de tributação privilegiada para empresas estabelecidas na Zona Franca de Manaus também restam expressamente mantidos no texto da reforma tributária, sem que se tenha explicitado os mecanismos pelos quais será implementada a manutenção destes regimes face à nova estrutura dos impostos sobre o consumo.

De qualquer forma, grande parte das variáveis acerca dos aspectos da nova tributação sobre o consumo restou relegada à normatização futura, através de legislação infraconstitucional. Estas definições e também as eventuais alterações do texto da reforma tributária pelo Senado  é que permitirão que se obtenha foto mais nítida de como será o novo sistema tributário, notadamente no que tange aos impostos sobre o consumo.

A verificar se o objetivo da simplificação de fato será atingido ou se as novas regras não formarão nova colcha de retalhos, repleta de exceções, alíquotas, regras especiais, restrições ao creditamento, além da profusão de obrigações acessórias. Aguardemos.


Eduardo Bomfim

Sócio de Lee Brock Camargo Advogados, mestrando em direito Político e Econômico pelo Mackenzie, especialista em Direito Tributário e Direito Empresarial pela PUC/SP e graduado em Direito pela UNESP.

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