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Nova modelagem regulatória da Coreia do Sul para IA

Nova modelagem regulatória da Coreia do Sul para IA

Não é à toa que a Coreia do Sul obteve o segundo lugar no Índice Bloomberg de Nações Mais Inovadoras de 2020. A inovação está diretamente ligada à sua economia, cultura e valores, não causando maiores surpresas o fato de o país se consolidar como a segunda jurisdição no mundo, depois da União Europeia, a promulgar, em janeiro deste ano, o seu Basic Act on Artificial Intelligence (AI Basic Act), considerado um marco abrangente de regulação da Inteligência Artificial (IA), que reuniu propostas de diferentes partidos e organizações para a aprovação na Assembleia Nacional.

Diante do potencial quase infinito das novas tecnologias de IA, especialmente a generativa, já em 2019, a Coreia optou por desenvolver sua estratégia nacional e iniciou o processo regulatório a partir de 2023, quando o seu Ministério de Ciência e Tecnologia, Informação e Comunicação reuniu um comitê de notáveis para propor uma regulação, promoveu consultas públicas em 2024, incorporou sugestões e encaminhou o projeto à Assembleia Nacional, ao final do ano passado.¹

A Ásia tem grandes escritores, mas Guimarães Rosa consegue sintetizar adequadamente essa visão de mundo K-power: a “natureza da gente não cabe em nenhuma certeza”. Tudo é desafio. E não são apenas as corporações e o governo coreano que estão otimistas frente à IA. Segundo a pesquisa global da Lloyd’s Register Foundation, realizada com mais de 125 mil pessoas em 121 países, mais de dois terços (70%) da população da Coreia têm a percepção de que a IA será positiva, seja para o país ou para os indivíduos. É um percentual muito acima do registrado na média global, de 39%.²

A regulação da IA na Coreia tem o condão de trazer uma nova proposta de modelagem porque, ao mesmo tempo que contempla a defesa de direitos, não tira o foco de o país buscar ser um líder tecnológico global. Para aumentar a competitividade, a cada três anos, o Ministério de Ciência e Tecnologia, Informação e Comunicação deve estabelecer um plano para impulsionar as tecnologias de IA junto às empresas e facilitar o crescimento de todas as demais empresas, sejam grandes corporações ou startups, incluindo o suporte para treinamento de talentos e expansão do mercado mundial.

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A evolução do emprego de sistemas de IA nas corporações coreanas saltou de 2,7%, em 2022, para 28% em 2023, dando a dimensão desse crescimento exponencial e da necessidade de adaptação aos novos sistemas de IA. E, para impulsionar ainda mais essa engrenagem agregada à nova lei, há um firme compromisso com a inovação e com o desenvolvimento sustentável.

Dentro dos requisitos regulatórios coreanos, a IA deve ser entendida como “a implementação eletrônica de habilidades intelectuais humanas, como aprendizado, raciocínio, percepção, julgamento e compreensão da linguagem”, cujos sistemas são definidos como sendo aqueles “que inferem resultados como previsões, recomendações e decisões que afetam ambientes reais e virtuais para objetivos determinados, com vários níveis de autonomia e adaptabilidade”.

Certamente, a nova regulação coreana sofreu o chamado “Efeito Bruxelas”, ou seja, influência regulatória da União Europeia, mas está consolidada em uma proposta mais enxuta e desafiadora. Sua estrutura tem como base a transparência, segurança e gestão de riscos, IA de alto impacto, representante local, governança e implementação, medidas promocionais e penalidade por não conformidade.

Há apenas dois sistemas de IA previstos no regramento coreano: de alto impacto e generativos. O primeiro envolve os impactos sobre a vida das pessoas, segurança e direitos fundamentais e, em caso de riscos, deve-se adotar uma conformidade adicional, planos de gerenciamento, mitigação e proteção do usuário ao longo do ciclo de vida da IA. E os sistemas generativos são considerados aqueles que geram texto, áudio, imagens e outros conteúdos criados artificialmente, mas com características de entrada como se fossem produzidos por humanos, devendo as empresas  notificar que estão utilizando a IA, como medida compulsória de transparência.

O AI Basic Act coreano está previsto para entrar em vigor em janeiro de 2026. De acordo com o Ministério de Ciência e Tecnologia, Informação e Comunicação, o novo modelo regulatório deve promover políticas inovadoras, sem estar centrada em uma abordagem excessivamente tecnocêntrica. Prevê apoio à pesquisa e ao desenvolvimento, padronização de tecnologias de IA e suporte para pequenas e médias empresas.

O marco regulatório coreano é considerado menos rigoroso do que o AI Act da União Europeia, porque conta com uma liberdade maior para a inovação. De acordo com o nível de risco, as empresas que incorporam tecnologia de IA de alto risco em seus produtos e serviços precisam cumprir os dispositivos de conformidade. Em comparação com a UE, que define as obrigações de acordo com os tipos de participantes na cadeia de valor de IA, a regulamentação coreana veio mais abrangente.

Em caso de descumprimento, o marco legal coreano prevê multas bem inferiores àquelas estipuladas pela legislação da UE de até 35 milhões de Euros ou de até 7% do faturamento anual mundial da empresa. Para além do peso das sanções pecuniárias, a Coreia centra mais a sua aposta na vigilância das condutas e na direção das ações, elegendo o seu Ministério de Ciência e Tecnologia, Informação e Comunicação para liderar a condução das investigações e para identificar, avaliar e mitigar os riscos, além de garantir a segurança e a proteção dos usuários.

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No que tange à estratégia nacional para IA, o governo coreano está focado em quatro focos: investir em tecnologia de semicondutores, habilitar os cidadãos para uso dos sistemas de IA, promover um governo digital e estabelecer a era da IA, cujo “norte” é centrar nas pessoas e trilhar um caminho de utilização ética dos sistemas, seguindo os princípios de preservação da dignidade humana, do interesse público/social e da adequação tecnológica.

Essa “solução pioneira” da Coreia busca bem equilibrar o avanço da inovação e com a devida proteção dos usuários, estabelecendo obrigações aos desenvolvedores de IA, que devem avaliar os riscos de seus produtos e serviços que tenham sistemas de IA embarcados, assegurando a todos o devido acesso a informações claras com medidas efetivas de segurança para mitigar a violação dos direitos fundamentais.

No caso das empresas estrangeiras que operam IA em setores de alto risco na Coreia, essas devem nomear um representante local, que será responsável pelas medidas de segurança e de apoio à implementação e pela confiabilidade para garantir a conformidade à nova regulação coreana de IA.

Se a inovação tecnológica está no cerne do crescimento e expansão da economia da Coreia do Sul, a IA deve ter um papel impactante, lastreado por uma estrutura regulatória enxuta e com uma governança proativa, a demonstrar um alinhamento ao esforço global de não sufocar a inovação, mas, sim, de colher os benefícios, sem esquecer de mitigar os riscos por meio de uma estrutura legal que assegure a confiabilidade e contemple salvaguardas éticas aos usuários contra abusos e danos.


1 Disponível aqui

2 Disponível aqui

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