Larissa Alves Bruno explica como a Lei n° 14.046/20 tem ajudado a minimizar maiores desequilíbrios econômicos nos setores turístico e cultural.
A Pandemia da COVID-19 causada pelo novo coronavírus e suas consequentes medidas emergenciais foram fatores significativos para o desequilíbrio em alguns setores da economia brasileira, principalmente o setor turístico, o qual teve uma perda de R$ 51,5 bilhões em faturamento entre o período de março a novembro de 2020, segundo aponta a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo – FecomercioSP, com um déficit de 33,4% a menos nas receitas do setor em comparação ao mesmo período de 2019 .
Visando minimizar e regular os efeitos econômicos e o desequilíbrio nas relações de consumo nos setores turístico e cultural foi promulgada, em 8 de abril de 2020, a Medida Provisória 948/20. Contudo, com o avanço e prolongamento da pandemia, bem como a complicação do cenário econômico mundial, a MP foi convertida, em 24 de agosto de 2020, na Lei n° 14.046/20, trazendo inovações significativas aos setores que regula.
A Lei n° 14.046/20, logo em seu início, acrescenta em suas disposições a hipótese de adiamento dos serviços, reservas e eventos, não prevista anteriormente na mencionada MP, mantendo-se, a não obrigatoriedade do fornecedor em reembolsar os valores pagos pelo consumidor desde que assegure a remarcação do serviço ou a disponibilização do crédito e abatimento em outras aquisições, silenciando, contudo, a respeito da formalização de acordo entre as partes, anteriormente prevista.
A retirada da hipótese de formalização de acordo dentre os deveres do fornecedor tem grande impacto para as empresas, uma vez que, o simples fato da empresa garantir a remarcação e a disponibilização ou abatimento do crédito já afasta sua obrigatoriedade de reembolso dos valores pagos, independente da anuência ou disponibilidade do consumidor.
Uma das modificações mais significativas trazidas pela Lei n° 14.046/20 é, também, a possibilidade de o fornecedor promover a dedução dos valores referentes aos serviços de agenciamento e de intermediação já prestados, como taxa de conveniência ou entrega, em caso de reembolso de valores ou créditos concedidos ao consumidor, os quais deverão ocorrer no prazo de 12 (doze) meses a partir da data de encerramento do estado de calamidade pública.
Ressalta-se que o prazo para solicitação da remarcação ou disponibilização de crédito também foi modificado com o advento da mencionada legislação. O prazo previsto na MP em tais hipóteses era de 90 (noventa) dias, no entanto, este passou a ser de 120 (cento e vinte) dias para solicitar tais operações, iniciando-se da data da comunicação do adiamento ou do cancelamento dos serviços, ou, até 30 (trinta) dias antes para a realização do evento.
A Lei n° 14.046/20 trouxe, também, a aplicação de seus dispositivos para os eventos que tenham sido lançados no decorrer do período pandêmico e que, eventualmente, tenham que ser cancelados ou adiados.
Há de se observar, ainda, que os eventos adiados em detrimento do estado de calamidade pública que tenham a necessidade de ser adiados novamente em razão do prolongamento dos efeitos emergenciais de saúde pública, serão igualmente acobertados pelos dispositivos da legislação em comento.
Por fim, a Lei n° 14.046/20 traz uma importante contribuição ao judiciário brasileiro e à proteção jurídica empresarial em seu artigo 5°, o qual prevê a impossibilidade de reparação por danos morais e/ou a aplicação de multas ou imposições de penalidades previstas no artigo 56 do Código de Defesa do Consumidor, em caso de cancelamentos ou adiamentos em contratos de natureza consumerista, tendo em vista que as hipóteses tratadas ao longo dos dispositivos legais são consideradas casos fortuitos e de força maior. No entanto, fica ressalvada a hipótese de má-fé, seja do prestador de serviço ou da sociedade empresária.
Pode-se concluir, assim, que a lei analisada foi acertada ao regular as hipóteses de adiamento e cancelamento dos serviços turísticos e culturais, buscando estabelecer um ponto de equilíbrio na relação consumerista, tentando minimizar as perdas e prejuízos, principalmente, empresariais.
Merece destaque o afastamento das reparações indenizatórias voluptuosas em detrimento das hipóteses previstas na legislação, bem como o fato de ter sido mantida a dedução dos serviços de agenciamento e intermediação já prestados, uma vez que, os adiamentos e cancelamentos são decorrentes de situação mundial excepcional, que fogem, inclusive, ao controle das próprias prestadoras de serviços, as quais se veem obrigadas a seguir um regramento especial e limitado ante à emergência de saúde, arcando, na maioria das vezes, com prejuízos muito significativos e que afetam diretamente a economia.
Segundo apontam dados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, entre os meses de agosto e novembro de 2020 o setor de serviços operou positivamente tendo, no entanto, diversas oscilações no campo econômico, sofrendo no mês de dezembro nova queda de 0,2%, o que foi considerado como estabilidade estatística pelo órgão. Ante a tais resultados o setor de serviços conseguiu recuperar 80% das perdas registradas em meio ao ápice da pandemia .
Ainda de acordo com o IBGE, após registrar uma sequência de 7 altas até novembro de 2020, o setor de turismo precisa avançar 42,9% para retornar ao patamar que estava em fevereiro de 2020, época de início da pandemia .
Assim, a edição de Medidas Provisórias e a promulgação de Leis específicas para a nova realidade imposta pela COVID-19, torna-se indispensável do ponto vista consumerista-empresarial, uma vez que há de se evitar excessos de penalidades a serem impostas ao setor empresarial, viabilizando o fluxo de caixa necessário à manutenção do negócio e recuperação da economia nacional.
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