A Ford vai deixar o Brasil, mas manterá, no país, um grande número de processos trabalhistas. Nos últimos cinco anos foram movidas 4.928 ações contra a companhia — a maioria delas, 3.535, ainda está em andamento no Judiciário (sem decisão definitiva ou em fase de execução e liquidação).
As disputas que vêm sendo travadas na Justiça Trabalho ao longo dos anos não têm sido fáceis para a montadora. Perdeu muito mais do que ganhou. Os trabalhadores foram atendidos em 2.312 processos já julgados e tiveram os seus pedidos rejeitados em 783.
A maioria ingressou com ação para pleitear verbas trabalhistas. Há casos, também, de pedidos de indenização por danos morais, doença ocupacional, acidente de trabalho e pensão vitalícia.
Esses dados foram levantados pelo escritório Lee Brock Camargo Advogados. A banca tem uma área especializada em inteligência artificial e consegue localizar os processos que estão nos bancos de dados do Poder Judiciário. Há uma equipe de advogados que auxilia na coleta das informações e também na interpretação dos dados.
“A projeção é de aumento significativo no volume de reclamações trabalhistas contra a montadora”, afirma Ricardo Freitas Silveira, responsável pela área de inteligência artificial do escritório, sobre o encerramento das operações da Ford no país.
O advogado diz que além de os resultados dos processos serem, historicamente, muito mais favoráveis aos trabalhadores, há concentração de ações em escritórios especializados em atuar contra a montadora. “Ou seja, os empregados serão abordados estimulados a ingressar com uma nova ação”, ele aponta.
Segundo consta no levantamento, os processos envolvendo a Ford estão concentrados em cinco advogados. Todos eles com registros para atuar no Estado de São Paulo.
É em São Paulo que está o maior número de processos. São 2.697 de todos os ajuizados nos últimos cinco anos no país. A quantidade se justifica pela presença da Ford no Estado. A montadora fechou a unidade de São Bernardo no ano de 2019 e mantém uma de suas maiores fábricas no município de Taubaté.
O valor médio das condenações aplicadas pelo Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, que abrange 46 municípios do Estado, está em R$ 117 mil.
A Bahia, onde fica outra grande fábrica da Ford, aparece em segundo lugar na lista de Estados em que há processos contra a montadora. Foram ajuizadas, nos últimos cinco anos, 781 ações. No TRT da 5ª Região, que julga as questões trabalhistas no Estado, o valor médio das condenações foi de R$38,8 mil.
Ricardo Calcini, professor de direito do trabalho, diz que essa litigiosidade toda não é uma exclusividade da Ford. “As montadoras, em geral, têm muitos processos, assim como os bancos. Essa ideia que está sendo criada de que a Ford está saindo porque existe um número muito grande de ações trabalhistas não parece verdadeira. O segmento todo tem judicialização muito forte”, ele afirma.
Calcini entende que poderá haver ainda mais judicialização com o fechamento das fábricas, mas diz que isso poderá ser evitado se a empresa, por exemplo, disponibilizar um plano de demissão voluntário para os funcionários que estão na ativa. “É a melhor saída para resolver o problema trabalhista no futuro”, pondera.
Sobre os casos que estão em andamento, o professor não vê motivos para preocupação. A montadora deve manter um representante legal no Brasil e esse representante vai responder enquanto os processos não estiverem definitivamente encerrados.
“Nenhuma empresa consegue dar baixa no seu CNPJ no país sem estar com a situação fiscal e trabalhista em dia. A empresa vai continuar existindo juridicamente mesmo que não tenha mais atividade aqui”, frisa Ricardo Calcini.
Em nota, a montadora informa que “estamos em contato e trabalhando intensamente com entidades e parceiros para desenvolver um plano com objetivo de minimizar os impactos do encerramento da produção. A Ford está comprometida em cumprir todas as suas obrigações”.
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