O acórdão do Supremo Tribunal Federal (STF) acerca da limitação da coisa julgada em matéria tributária (Temas 881 e 885) sequer foi publicado, mas Fisco e contribuintes já travam intensa batalha acerca da intepretação e do alcance do julgamento.
Na ótica do Fisco a questão está exaurida. A coisa julgada obtida para o não pagamento de tributos de recolhimento continuado cessa automaticamente assim que decisão em sentido contrário venha a ser ou tenha sido posteriormente exarada pelo STF em julgamentos que envolvam controle direto de constitucionalidade ou segundo a sistemática de repercussão geral.
Para os casos futuros, de fato, o assunto resta resolvido. Quando o STJ vier a firmar tese no sentido de que determinada exação é constitucional, a partir dali, cessa a eficácia de decisão individual anterior transitada em julgado, respeitadas nos termos da tese firmada “a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal”
A questão complica-se com relação a declarações de constitucionalidade do passado vis a vis decisões individuais transitadas em julgado em passado ainda mais remoto. E é justamente o caso dos temas 881 e 885, que trataram especificamente da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSSL) que foi declarada constitucional pelo STF em 2007. A partir daquela data o Fisco passou a cobrar a contribuição das empresas que, em contraposição, sustentaram a existência de coisa julgada em seu favor.
Atualmente, o Fisco pretende continuar a cobrança de tributos já lançados contra contribuintes que obtiveram decisões transitadas em julgado para não os recolher que restaram suplantadas por decisões do STF e também de lançar (cobrar) tributos não recolhidos nos anos anteriores, retroagindo, no primeiro caso, à decisão contrária à coisa julgada exarada pelo STF em 2007 e adicionalmente, no segundo caso, ao prazo decadencial (5 anos).
Já os contribuintes estão certos de que há, na decisão do STF e, sobretudo na não modulação de efeitos, mácula ao Princípio da Segurança Jurídica, pelo que é certo que a matéria será revisitada, em diversos ângulos, em embargos de declaração assim que publicado o acórdão do STF.
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O Ministro Barroso, em recente entrevista, defendeu não haver qualquer surpresa para os contribuintes de que os valores de CSSL continuariam a ser cobrados pelo Fisco após a decisão de 2007 e que, postura e contrário, caracterizaria “aposta” dos contribuintes.
Ocorre que em 2011, o Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática de recursos repetitivos (Tema 340), conclui expressamente, no que tange a CSSL que “o fato de o Supremo Tribunal Federal posteriormente manifestar-se em sentido oposto à decisão judicial transitada em julgado em nada pode alterar a relação jurídica estabilizada pela coisa julgada, sob pena de negar validade ao próprio controle difuso de constitucionalidade“.
Ora, sem adentrar em outros argumentos contrários à aplicação retroativa do quanto decidido pelo STF acerca da superação da coisa julgada, sobretudo no caso da CSSL, parece que o precedente de 2011 do STJ (vinculante, nos termos do art. 1.039 do CPC) é fundamento suficiente para que os contribuintes pudessem se fiar – com segurança – de que, as decisões individuais transitadas em julgado para não recolhimento da CSSL não deixaram de vigorar, automaticamente, por conta declaração de constitucionalidade do Supremo em 2007.
E parece bastante claro que aquele precedente vinculante do STJ de 2011 só perdeu sua eficácia com a novel decisão do STF de 2023 acerca da superação da coisa julgada, de modo, que, no mínimo por esta razão, para atender o Princípio da Segurança Jurídica, a superação da eficácia das decisões que permitiram o não recolhimento da CSSL somente se dê a partir do julgamento do STF em 2023.
Eduardo Bomfim
Sócio de Lee Brock Camargo Advogados, mestrando em direito Político e Econômico pelo Mackenzie, especialista em Direito Tributário e Direito Empresarial pela PUC/SP e graduado em Direito pela UNESP.