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O desafio do contencioso de volume

A gestão de processos em massa é um tema importante e merece atenção. Aparentemente simples, os procedimentos administrativos de controle e gerenciamento das demandas judiciais geralmente são encarados como fáceis de se resolver e a intuição do advogado-gestor o leva, naturalmente, a achar que entende do assunto. A realidade, no entanto, não é bem essa.

A maioria dos departamentos jurídicos enfrenta sérios problemas de gestão dos processos e é encarada como o setor que gera apenas despesas contra a empresa. Mas não precisa ser necessariamente assim.

Tomemos como padrão uma empresa de varejo que possui mil funcionários, 100 mil consumidores finais, 1,5 mil novas ações por mês e um estoque de 9 mil processos em andamento.

É possível transformar o departamento jurídico em uma área da empresa voltada para a resolução preventiva dos problemas

Para gerenciar essa empresa, o departamento jurídico conta com quatro escritórios prestadores de serviços, de alguma maneira integrados com seu sistema interno, que realizam atividades diárias como audiências e elaboram defesas. Mensalmente, o jurídico deve prestar contas das despesas relacionadas com custas, condenações e acordos; entregar o contingenciamento; gerenciar os escritórios e atender aos questionamentos e dúvidas dos departamentos internos da empresa.

Para finalizar este cenário modelo, no trâmite dos processos ocorrem, simultaneamente, bloqueios on-line nas contas da empresa através do sistema Bacen-Jud, do Banco Central, assunto conduzido diretamente pelos escritórios externos.

Até que, em um determinado momento, o presidente da empresa chama o diretor jurídico e faz alguns questionamentos simples: qual o valor dos bloqueios judiciais levantados e quanto há pendente de levantamento? Ou qual o valor dos depósitos judiciais?

Essas informações existem, mas onde elas estão? E quanto tempo o diretor jurídico levará para reuni-las? Sendo um banco de dados único ou não, ele corre o risco de perder o controle ou, simplesmente, de um dos prestadores de serviço não preencher os dados básicos em seu sistema e, assim, não haver de onde puxar essa informação. Os escritórios externos também poderão gerar seus relatórios individualmente em planilhas para consolidação posterior. Parece assustador, mas isso acontece.

A qualidade jurídica e a responsabilidade do advogado dentro dos preceitos da ética e da boa conduta são intrínsecos à prestação de serviços jurídicos, mas é importante saber muito mais além da quantidade de casos novos, de casos encerrados por acordo e de condenações.

Se a situação descrita acima acontecesse em sua empresa, seria possível, com a metodologia de trabalho atual, solicitar o cruzamento das informações processuais com as informações financeiras para responder às perguntas do presidente? Seria possível gerar um relatório de “business intelligence” para identificar eventuais gargalos?

Em primeiro lugar, é preciso que os departamentos internos da empresa trabalhem em conjunto para solucionar suas demandas. Não basta atuar apenas de maneira defensiva e isoladamente – no caso em questão, o departamento financeiro, a controladoria e o jurídico. O sistema deve conter um banco de dados com informações suficientes para a geração desse relatório, com campos para preenchimento e informações atualizadas, integrando os sistemas e envolvendo todas as áreas responsáveis.

Existem outras inúmeras questões e desafios que precisam ser abordados pelas empresas para que elas consigam, efetivamente, reduzir suas demandas judiciais e melhorar sua performance.

As informações geradas por um sistema integrado e com dados suficientes para atender as demandas do contencioso de massa poderão, por exemplo, indicar o montante levantado pela parte contrária nos bloqueios e os valores ainda disponíveis e indicar essas informações para a contabilidade da empresa. Outro exemplo, que demonstra ainda mais a eficácia de um departamento jurídico integrado com as demais áreas da empresa, é a possibilidade de identificação das principais causas de origem dos processos da empresa. Em conjunto com os demais departamentos, o jurídico pode, com essas informações disponíveis, sugerir melhorias como treinamentos específicos, a alteração de uma embalagem e até mesmo a mudança de algum procedimento interno.

Atuando com metodologia, sistema e conhecimento profundo do tema, é possível transformar o departamento jurídico em uma área de negócios da empresa voltada para a resolução preventiva dos problemas e não somente à defesa jurídica das demandas recebidas. Assim, o departamento jurídico passa a participar da construção do resultado positivo da empresa.

Fabio Rivelli é advogado especialista em direito do consumidor e gestão de contencioso de massa em grande escala e diretor da área de “consumer claims” do escritório LBCA ­ Lee, Brock, Camargo Advogados.
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações

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